sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A nova regra ortográfica da Língua Portuguesa


Todo mundo já deve estar careca de saber que, a partir de 1º. de janeiro de 2009, entra em vigor a nova regra ortográfica da Língua Portuguesa. Na verdade, o que pouca gente sabe é que, pela primeira vez na história, a mesma será unificada entre todos os países falantes dessa. Aliás, este acordo já encontrava-se no papel desde 1994, mas ainda não havia sido cumprido por conta de negativas de alguns países mais pobres (como Moçambique e Cabo Verde), que alegavam não ter dinheiro para produzir novos livros de Língua Portuguesa com a regra atualizada.
O objetivo da APLP (Associação dos Países de Língua Portuguesa) parte do princípio de que, unificando a nossa língua, as diferenças culturais também caiam, unificando cada vez mais as terras outrora conquistadas pela "terrinha". Seria um re-colonialismo? Por incrível que pareça, não - ao que se percebe, agora a gramática irá se aproximar muito mais do que é usado no Brasil do que em Portugal, embora isto seja apenas um teorema. O que não quer dizer, entretanto, que todo mundo irá sair falando o mesmo idioma. Haverá, sim, os dialetos(o Português Pátrio, o Português Brasileiro, o Português Angolano, dentre outros), mas a NORMA, esta sim, será única.
Agora, e o que vai acontecer quanto a norma? Bem, de cara, antecipo que algumas mudanças são interessantes, mas outras parecem ser uma "fumada de orégano". Primeiro, vamos falar das "bacanas", depois das "doidonas".
Das mais valorosas, certamente está o fim de muitas regras de paroxítonas, como a dos ditongos abertos(ei e oi). Por exemplo, acabaram os acentos em jibóia, em tramóia, em colméia, em prosopopéia. Também acaba o acento no "oo" e no "ee", que geralmente são verbos conjugados no plural. Assim, dê tchau para vêem, vôo, enjôo... agora serão veem, voo e enjoo.
Outro pesadelo dos alunos (boa notícia para meus filhinhos e meus amores) é o fim dos acentos nas formas rizotônicas de "i" e "u", precedidos de "g" e "q" e sucedidos de "e" ou "i". Assim, caem os acentos de argúi, averigúe, enxagúe... na verdade, isto NÃO É próprio da língua portuguesa no Brasil, mas em alguns países africanos. Apesar disso, uma complicação a menos.
Por fim, está a mudança no "i" e "u" tônicos precedidos de ditongo (tanto crescente quanto decrescente). Ou seja, pulam fora as formas baiúca, boiúna, cheíinho...
São boas notícias? Com certeza. Mas agora vêm as ressalvas. E elas são muitas.
Particularmente, não vejo com bons olhos a entrada do k, w e y. Por que, professor? Pelo seguinte: estas letras não são originárias do filo latino, mas do filo germânico (que deu origem ao alemão e ao inglês). Ou seja, estão sendo inseridas por um contexto de globalização. É importante globalizar a língua? Claro, mas a questão é que NÃO EXISTEM palavras na Língua Portuguesa que possuam k, w ou y. Isto irá abrir a possibilidade de inserção de palavras que NÃO SÃO de origem portuguesa, como marketing. O que pode ser bom ou não, a depender do uso. E pode, simplesmente, exterminar algumas palavras originárias da nossa língua, como publicidade (que é o marketing, oras).
Outro problema ocorre com a extinção do trema (¨). Na verdade, o trema é um sinal gráfico realçador de uma vogal ou semi-vogal. Na Língua Portuguesa, o mesmo só era utilizado na letra "u" para diferenciá-la do dígrafo "gu"(que tem som de "g") e "qu"(que tem som de q). Assim, freqüente, por exemplo, passa a ser escrita como frequente. E corre o risco do aluno não entender por que dizemos freqUente e de não dizer qUestão. Caberá aos professores terem o raciocínio de não perderem o propósito do trema para poder argumentar com os seus alunos.
Agora, de todas as mudanças, a que achei a maior "cheirada de adoçante" foi a do hífen. Tudo bem que este "tracinho" sempre atrapalhou a cabecinha de muita gente, inclusive deste que vos fala. Porém, devemos entender que isto irá criar um sério problema na cabeça dos alunos, principalmente na alfabetização. Eu diria que noventa por cento das palavras que usavam hífen deixarão de utilizá-lo. Por outro lado (talvez para compensar), algumas que NÃO TINHAM passam a utilizá-lo.
Basicamente, deixam de usar hífen nas palavras formadas por prefixos ou falsos prefixos terminados em vogal e sucedidos por palavras que começam por "r" ou "s". Ou seja, ante-sala passa a ser antessala. E auto-retrato passa a ser autorretrato. A excessão ocorre se o prefixo ou falso prefixo terminar em "r" ou "s", como em hiper-realista. Ela continua hiper-realista.
Também se extingüe o hífen nas palavras formadas por um prefixo ou falso prefixo terminado em vogal e sucedido de palavra iniciando com vogal. Então, dê adeus para auto-afirmação, auto-escola, semi-árido... com a regra, tornam-se autoafirmação, autoescola e semiárido. Bom para aquele "tiozinho" que montou uma auto-escola e o "burro" do letreiro escreveu "autoescola". Ele não precisa jogar a placa fora, basta esperar que em 1º de janeiro de 2009 ela estará CORRETA e nenhum professor de Língua Portuguesa poderá usar como exemplo de "erro abominável". Lamentável!
Outra forma que deixa de usar hífen são os compostos que, pelo uso, perderam noção de composição. Então, saem de cena manda-chuva, guarda-chuva e pára-raios e entram para o espetáculo mandachuva, guardachuva e pararraios. A Warner, em tempos de crise, vai gastar uma grana preta mandando refazer as caixas dos boxers do Manda-Chuva, seu clássico desenho animado sobre um gato malandrão. Aliás, um dos meus favoritos!
Também deixam de usar hífen as locuções de qualquer tipo: substantivas, adjetivas, prepositivas, pronominais, conjuntivas, adverbiais... ou seja, agora serão fim de semana, sala de jantar, cor de vinho... porém, algumas locuções preservarão o hífen, como água-de-colônia, pão-de-mel, pé-de-meia, ao-deus-dará, dentre outras.
Quem passa a usar hífen obrigatoriamente são as palavras com prefixo ou falso prefixo terminado na mesma letra que inicia a palavra posterior, como em antiinflamatório e microorganismo. Neste caso, tornam-se anti-inflamatório e micro-organismo. De resto, continuará tudo como dantes no quartel de Abrantes.
A minha ressalva quanto a extinção do hífen não é implicância gratuita. É que simplesmente ele está sendo abolido por um capricho, sem nenhuma justificativa plausível - até agora não vi uma que me convencesse. A mais próxima disto foi quando afirmaram que o hífen fazia com que algumas palavras ficassem muito mal esquematizadas. Mas, se foi por isto, por que não se aboliu o hífen de maneira permanente ou o instituiu em definitivo? Putzgrila, era tão mais simples... mas, basicamente, inverteu-se a ordem dos elementos para dizer que foi dado uma "gabaritada" na nossa língua. Particularmente, achei que é apenas uma mudança sem pé, nem cabeça.
Outra coisa que não entrou na minha cabeça foi a extinção dos acentos diferenciais, como em péla, pêra, pára... agora serão pela, pera e para. Imagine você lendo um outdoor na rua e, de repente, topando como "Não vá para"... aí você pensa "oxe, não ir para onde?" e, do nada, tu cais numa cratera, como se tivesse se projetado do Elevador Lacerda... triste, muito triste, triste até demais.
Bem, como professor de Língua Portuguesa, rezo e espero que as mudanças propostas ajudem e não atrapalhem nossos alunos. A minha torcida é que isto auxilie e facilite o ensino, mas confesso que não ando muito crente que isto venha a ocorrer. Ao contrário, temo que a nova regra mais atrapalhe do que ajude. Vamos ver o que irá acontecer a partir de 1º. de janeiro do próximo ano, quando ela entrará em vigor.
Em tempo: a nova regra entra em vigor a partir de 1º. de janeiro de 2009 sim, mas ela co-existirá com a regra antiga (no Brasil, presente desde 1971) até 31 de dezembro de 2011. Somente em 1º. de janeiro de 2012 a nova regra será obrigatória. Ou seja, por enquanto, não se preocupe com fim de trema, uso de hífen e acentuação em ditongos abertos e o escambau. Mas já é bom ir treinando no decorrer do ano que vem para você fazer bonito a partir de 2012.
Beijos para as meninas.
Aos rapazes, apenas um aceno de longe.
Prof. Raimundo Poeta

Um comentário:

Anônimo disse...

Sou totalmente contra esse tipo de "restauro" ortográfico.
De que serve vc aprender regras e mais regras de hifem, acentuação e outros babados, e ser massacrado por anos caso não as aplique com a devida pertinência, se de uma hora paa outra mudam tudo e fica por isso mesmo.
Muito estranho.
Sou do tipo que aprecia o "archadismo". Por mim escreveria sympathia, communicado, idonneo, pharmacia... rsrs